sábado, 13 de março de 2010

Branca de neve

E ela ficou assim, linda, linda, toda de branco



Era março e esperávamos a primavera. Flores e manhãs cálidas, coisas assim. Que permitissem eliminar uma camada da indumentária, deixar uns centímetros de pele a mais a descoberto. Pescoço, punhos, com ousadia até uma parte do antebraço. Ou do tornozelo.

Mas não. Naquela manhã cinza e feia, chovia. Chovia muto. Capas de chuva, botas, guarda-chuva. Toda a parafernália. Que saco! E ainda por cima numa segunda-feira. Ninguém merece.

Pela janela do escritório, assistíamos indiferentes as gotas caírem. O céu cinza, cinza. O chá esfriava desinteressado nas canecas.

De repente, algo começou a acontecer. Os pingos se tornaram mais pesados, espatifavam cada vez mais ruidosos na terracinha atrás de mim. O cinza do dia foi mudando de cor, cada vez mais claro. Até que aconteceu o inexplicável: os pingos começaram a flutuar, cada vez mais brancos, cada vez mais gordos.

Nevou em cima de mim, do meu ninho, da minha casa e da cidade inteira. O dia inteirinho. Como não acontecia há 17 anos, segundo os jornais. E nossa indiferença pela chuva virou perplexidade e alegria – menos dos russos e dos escandinavos: Grande coisa, pensaram eles, voltando o olhar pro computador. Mas um americano de Boston se entusiasmou.

Quem pôde, tirou fotos com o celular. Todos saíram pelo menos uns minutinhos na terraça pra ver o centro da cidade se cobrindo de branco. Até os russos e os escandinavos.

A caminho do metrô, todo mundo sorria em segredo, nem aí pro peso dos flocos forçando os guarda-chuvas pra baixo ou anunciando casacos molhados dali uns instantes. Na saída, como ninguém me olhava, abri a boca para deixar nevar ali dentro.

E eu, que não gostava de frio, de inverno, que a cada ano faço contagem regressiva para a primavera chegar, recebi com alegria infantil a neve na cidade em que moro. Neve eu já havia visto, mas era turismo: era preciso viajar para chegar até ela. Quando ela veio até a minha casa, virou presente – mesmo que os trens tenham deixado de funcionar, que o trânsito tenha virado um caos, que um monte de gente tenha ido pra casa às pressas ou ficado preso no trabalho, sem luz até. Eu aposto que ninguém ligou.

E fiquei com vontade de que nevasse mais vezes.

by Womber-Snow White-Woman