terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Do POP, de sangue e de fome


Olho para os primeiros lugares dos mais vendidos com aquela desconfiança que acompanha a todos os que aprenderam (ensinaram isso pra gente na escola?) que o que mais vende deve ser ruim. O romance mais vendido deve ser ruim (taí o compatriota campeão de vendas Paulo Coelho para não nos deixar mentir), o CD mais vendido deve ser uma droga (taí também o belo casal Calypso para comprovar nossa teoria) e da música à literatura, estendemos nosso preconceito do que é POP por tudo o que repousa sobre a Terra.

Mas os fenômenos de venda também me causam certa curiosidade, especialmente quando se trata de criaturas fascinantes com dentes afiados. O que mais vende “a nível de” vampirismo? A seqüência Crepúsculo- Lua Nova- Eclipse- Amanhecer. Sim, assisti aos dois primeiros e li Lua Nova, não sem certo constrangimento, é verdade, de trair esse antigo ensinamento de que o que é muito POP deve ser de péssima qualidade.

Além de me deliciar sozinha no cinema numa quarta-feira com pipoca com a fascinante arte pós-moderna da musculação + anabolizantes que fez com que Jacob Black ganhasse cadeira cativa no imaginário das mulheres com mais de 11 anos (minha mãe viu, a mãe de uma amiga viu e a reação é sempre a mesma, independente da idade: Nossa, que coisa + linda. Meu Deus!!!), vejo no romance dos vampiros atuais belas metáforas da paixão.

Envolta num cenário adolescente de dramas shakespereanos (não é a toa que Romeu e Julieta são referências constantes na relação do casal da história), com um certo ar “emo” e aquela capacidade de sofrer que só uma adolescente tem, Julieta tinha 14 anos quando conheceu Romeu.

Não estrago as surpresas (para quem quiser ver ou ler) ao contar que Edward- o vampiro por quem Bella, que é humana, se apaixona- tem o poder de ler a mente das pessoas.

Mas Bella para ele é opaca, somente a ela ele não tem acesso, ela a quem ele ama. Além de não conseguir ver os pensamentos da amada, Edward precisa controlar-se para que sua fome por Bella não o faça mordê-la, o que a mataria.

Bella, do seu lado, anseia para que Edward a morda e ela se torne vampira através dele, assim os dois teriam sempre a mesma idade e, literalmente, poderiam viver para sempre juntos.

Parece ter sido essa mesma escolha a de Romeu e Julieta, morrer juntos em seu amor.

A paixão tem algo de violento, de assassino do outro. Uma fome grande demais, vontade de morder, de colocar pra dentro, de transformar o outro na mesma coisa, tornar igual, abolir diferenças.

Penso o fato de Edward não poder ler os pensamentos de Bella como uma bonita metáfora do apaixonamento. Por mais aguçados que possamos ser para captar o outro, seus sentimentos, motivações, ao apaixonar-se o alvo da paixão se torna obscurecido pelo calor de tamanha fome.

Não é a toa que vampiros sempre foram, para mim, essa imagem misturada de sedução e morte, de fome e querer-bem, e querendo tanto, tomar o outro dentro de si.

Na história de Edward e Bella e Jacob cenas de sexo não entram, cenas com as quais os nosso olhos estão acostumados e cansados. Me parece que a autora nos trouxe algo tão antigo quanto esquecido, o calor desse desejo de se entregar, um querer que dói, abre buraco no peito, escurece a visão.


Se os vampiros ficam escondidos em Forks (cidade onde se passa a história) nós, mortais, temos nossas maneiras de se entregar, de morder e de querer muito alguém...

Por Mirabelle