sexta-feira, 21 de agosto de 2009

A vida no campo e a vaidade feminina “a nível de” menos um


A mulherada muito evoluída espiritualmente e desapegada do corpo que me perdoe, mas este fim de semana tive uma experiência chocante. Talvez seja coisa desse continente velho-mundesco, berço entre outras coisas da revolução de maio de 1968, com tantos meses de inverno pra deixar o corpo tapado debaixo de um monte de pano (e poder desencanar sub-repticiamente de depilação, pedicure, celulite e até de alguns quilos a mais), talvez seja algo de países mais evoluídos com uma maior renda per capita, yo qué sé. Ou deve ser um efeito da onda de calor que passou por aqui e devastou o senso estético das minhas anfitriãs.

Minha aventura foi assim: lá vou eu, o queridão, os dois filhotes, todas aquelas tralhas de que você precisa quando viaja com criança pequena debaixo do braço, passar uns diazinhos no campo, num pueblo, a convite de um casal de amigos, que também tem uma filhinha de dois anos. Fomos de trem lá pro cafundó do cafundó, num vilarejo de uns 500 habitantes (sim, o trem chega até lá perto do cafundó), na casa em que esse casal de amigos aluga num pique comunitário com mais seis famílias. Explico: é um casarão medieval do século XIII, com seis quartos grandes e muito, muito espaço para as crianças ficarem soltinhas na delas, na piscininha inflável do quintal, correndo pelo salão, brincando na varandona, pastando no jardim ou o que elas bem entenderem. Cada família tem seu quarto e as áreas comuns são compartilhadas.

Nesse ambiente de “vida em comuna”, onde refeições, manutenção da casa e vigilância dos rebentos são feitos coletivamente, sou recebida por duas matriarcas além da minha amiga. Pessoas fofas, legais mesmo, com um papo e uma cabeça ótimos, profissionais liberais e excelentes mães. Mas com uma determinação por cultivar os pêlos das axilas como eu nunca vi na minha vida.

Sei lá, a gente ouve lendas de como na Europa existe mulher que tem uma tarântula embaixo do braço ou uma mata atlântica na genitália. Mas, no mês de agosto e com o calor que está fazendo eu me pergunto: em pleno verão, minha gente? Eu digo “determinação” porque não é que fazia três dias ou uma semana que a moça não via uma gilete, é que pra chegar naquele estado era preciso de ao menos um mês de cultivo de pêlos. Gentem, um mês! Nem meu queridão tem um sovaco peludo daqueles.

Mas a coisa não pára por aí. Fosse apenas esse detalhe, é óbvio que faço um esforço pra relevar. Outras latitudes, outras culturas, do diferente se aprende e, enfim, eu também devo ser um bicho muito estranho aqui de vez em quando. Vamos por partes: some-se a isso que as matriarcas não faziam as mãos (as unhas delas pareciam as de um moleque de 12 anos, nem pra deixá-las assim, crescidinhas e lixadinhas, era que as unhas estavam do jeito que estavam, num pleno estado de inércia). Sobre os pés, então, dispensarei comentários. Ok, ok, estávamos no campo, num ambiente rústico, realmente ninguém ficava desfilando um pezinho bonitinho em uma sandalinha meiga, eles estavam sempre poeirentos porque ali essa coisa da natureza era um pouco implacável. Além do mais, entendo que nesse ambiente o cuidado com os cabelos não seja prioritário e parecia que não era um problema ter um monte de fios brancos aparecendo (sobre isso não posso discorrer, pois graças a Deus ainda não tenho que me preocupar com a questão), mas vamos acrescentar mais um pouco de informação visual: a matriarca nº 1 usava um look curto estilo “rapei e deixei crescer” e a matriarca nº 2, “tá comprido e ponto”. Nada de uma fivelinha, um lencinho, uma tiara verde-limão ressurgida dos anos 80, um detalhe que fosse (ou que revelasse alguma cosmética mais específica que o creme rinse de cada dia).

Mas o choque veio mesmo o dia que fomos à piscina do pueblo com as crianças.

Não bastasse o cenário descrito anteriormente, as virilhas faziam jus às axilas. Mas o que mais me chocou, que me deixou consciente do quanto aquela militância podia chegar até a medula, era o biquíni que a matriarca nº 1 estava usando. Além de ser um biquíni com a parte de baixo maior que a que minha avó usa pra ir na praia, parece que ela fazia questão de pegar o mais velho, desbotado, sem elástico e acabado do guarda-roupa. Eu fico me perguntando como pode ser que a sensualidade de um ser humano seja negada a tal ponto, como alguém pode ter uma vaidade tão próxima do zero. As roupas que essa matriarca usava também eram as mais desbotadas, sem elástico e surradas que eu já vi. Devo ter perdido alguma coisa porque não entendi muito bem apologia do quê ela estava fazendo.

Eu quero deixar claro que não sou nenhuma perua, nem mesmo patricinha eu me considerei um dia. Mas acho que tem limite pra tudo. Estar sempre e 100% impecável é difícil e uma meta almejada apenas por mulheres muito mais perfeccionistas e determinadas do que eu, afinal, o corpo feminino exige altíssima manutenção e a maioria das mortais tem seus deslizes estéticos aqui ou ali. Mas querer juntar todos eles de uma vez só por opção (porque se tratava da opção da matriarca, não da falta de opção, pois ela bem que poderia lixar as unhas, passar uma gilete na tarântula ou escolher outras roupinhas um pouco menos velhas se quiser), eu confesso que não entendi.

Fiquei pensando se o maridão da matriarca era uma figura assim tão castradora dessas que não suporta que os outros achem a mulher dele bonita (tipo o cara que não deixa a namorada usar mini-saia), mas analisando o sujeito ficava bem claro que a coisa não ia por aí. De repente, encontrei uma hipótese que pareceu encaixar: era uma prova para ele. A matriarca estava testando o verdadeiro amor do sujeito por ela. E cheguei à conclusão de que o amor do cara era real, e por isso aquela família com seus dois rebentos parecia tão feliz.

Gostaria de dedicar este post às matriarcas europeias muito queridas que me receberam estes dias com suas tarântulas na axila e esse padrão de beleza de mulher do mato medieval que ainda não acabei de assimilar e, claro, aos admiráveis indiozinhos que, apesar da vontade do europeu em dizimá-los, acabaram ensinando o colonizador a tomar banho todo dia, que essa história de pêlo não tá com nada e que é importante sim usar um colarzinho e um adorno mesmo (ou sobretudo) quando se trata de andar pelado. Viva a Pindorama!

POSTADO POR darling, darling

Um comentário:

  1. Querida darling darling, penso que sua surpresa com a falta da gilete e sua generosidade em dividir isso com a gente só nos ajuda a crer que de fato a "depilação fio-dental" é um artigo de exportação que deveria ser patenteado pelo Brasil!!! Aliás, sempre falei pra minha depiladora da facul, que cobrava 7 pila e fazia em 15 minutos que ela ía ser rica lá fora!!! Salve a floresta Amazônica que possui a flora e a fauna que não nos cabe cultivar... POR COCOBELLE

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