domingo, 19 de dezembro de 2010

Espírito natalino


O ano vai acabar, vai acabar comigo também. Estou cansada, quase exausta, meus ombros já repletos de fardos tem ainda de sustentar sobretudos que pesam quilos, amortecidos por isolantes e incontáveis camadas de lã, o pescoço rígido pelo cachecol. Tem ainda de caminhar com bujõezinhos humanos erguidos: eles se recusam a caminhar ou a estar no carrinho por centenas de metros, obstinados e bem abrigados, confiando nos bíceps, omoplatas, seja lá o que e onde estão essas partes todas debaixo de tanta roupa.

Mas na sala de minha casa há um pequeno pinheiro, O-Tannenbaum, vivinho e verdejante, entalado dentro de um vaso. Ele também está ali aprisionado pelas estrelinhas, esferas brilhantes, luzes minúsculas e outros pequenos artefatos de madeira, papel ou pano dependurados, esperando, por favor, que tudo isso acabe e ele possa ao menos ser colocado no jardim, destino menos cruel que o lixo – orgânico, of course, pois nos arredores há coleta seletiva e politicamente correta especial para pinheirinhos descartados entre os dias 7 e 15 de janeiro.

E o pior de tudo, minha gente, é que todo mundo acha pinheiro e mãe exausta uma coisa linda! Não é lindo? Não é meigo? Não é fofo?

Duas palavrinhas: HELP ME.

Tá bem, não era bem isso o que eu queria dizer. Vou retificar: FELIZ NATAL!


Afinal, o que seria do espírito natalino sem as mães exaustas e os pinheirinhos aprisionados?

Um bom natal para todos, em especial para as mães, aquelas que encontram a paciência e o tempo que os outros não têm para organizar o amigo secreto da família, decorar a casa, montar o presépio e a árvore de Natal, comprar aquele presente que ficou faltando, preparar a ceia e ainda estarem lindas e radiantes em plena meia-noite na próxima sexta-feira depois de trabalhar toda a semana. Papai Noel de saco cheio (mães, never!) pra todo mundo e vamos que vamos!

W.W.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Sertanejo universitário

(que belezura de estampas!)
“O doce do seu beijo,
Enfeiticou meu coração,
Vivo noite e dia, numa nuvem de paixão”

“Te dei o sol, te dei o mar
Pra ganhar seu coração.
Você é raio de saudade,
Meteoro da paixão”

Não! Você não morreu e foi para o inferno das piores cantadas do mundo.

Você também não está lendo trechos dos finalistas de um concurso de textos de amor do ensino fundamental.
Essas estrofes são pérolas da nova tendência na música brasileira: o sertanejo universitário.

Eu já tinha ouvido algumas partes dessas músicas e ficado perplexa com a riqueza das rimas, a delicadeza no tratamento dos temas como por exemplo em:

“Você diz que não me ama, você diz que não me quer
Mas ficar pagando pau, qual é que é.
Todo dia seu teatro é exatamente igual, você finge que me odeia
mas no fundo paga - pau"

Mas eu pensava... ah, vai ver que tá na moda, em especial entre as mulheres, porque os cantores devem ser bonitões...

Vamos colocar da seguinte maneira: misture o que sobrou da tradição do homem do campo, do interior (isso é churrasco e cerveja) com o que há de pior do universo urbano (aqui caluniosamente chamado de universitário).
Resultado: uns caras que exageram no churrasco e na cerveja vestindo calça skinny e camiseta bordada. Jesus me abane aquela mulherada pagando pau (para usar termos locais) para os moçoilos roliços envoltos apertadamente em seus jeans.

Alguns amigos músicos se queixam do agressivo mercado musical no qual as grandes gravadoras e mídias injetam guela abaixo do público produtos de péssima qualidade. Eu discordo, acredito na escolha das pessoas e acho que algo só faz muito sucesso se ecoa, se faz sentido para muita gente.

É curioso como certos estilos musicais abraçam determinados valores e maneiras de falar das coisas. O reggae fala de paz, de humildade e de igualdade, forró fala de chamego, de carinho e de calor, bossa nova fala de amor romântico, de tristeza séria.

O sertanejo universitário tem uma pegada romântica-Wando, tipo: arrebatamento de paixão, calcinhas ao palco e tal misturado com desdém, com desprezo pelo outro, no maior estilão: “tenho 14 anos, sou + eu e nego todos os meus sentimentos”.

O sertanejo universitário está fazendo sentido pra muita gente, provavelmente não só pela pegada sacaninha e animada de balada, mas também por essa maneira de tratar os sentimentos e os relacionamentos.
Metade das músicas são Wando-paixão-abatjour cor de carne, e a outra metade são beijo-me-liga.

Perdão pela interpretaçãozice da reflexão, mas se pessoas que tem mais de 18 anos e não tem diagnóstico de transtorno bipolar se identificam com o que essas músicas falam, é porque estão vivendo ou querendo viver suas relações dessa maneira: ou sou tomado por uma paixão arrebatadora ou desdenho e desprezo o outro.

E não é que Fernando e Sorocaba entendem profundamente o que Baumann fala sobre o amor líquido?

Entre o meteoro da paixão de Luan Santana e o desprezo do João Bosco e Vinicius eu fico com Cazuza, que diz coisa menos exuberante, mas mais de verdade:

Eu quero a sorte de um amor tranqüilo
Com sabor de fruta mordida
Nós na batida, no embalo da rede
Matando a sede na saliva

Pagando Pau- Fernando e Sorocaba
Meteoro- Luan Santana
Ei. Psiu! Beijo me liga- João Bosco e Vinicius
Todo amor que houver nessa vida- Cazuza
Por Mirabelle